APENAS PENSO
Sim,
penso em um fato qualquer – uma chegada, uma partida, um momento, um carinho, um
toque – coisas simples que acontecem no correr do dia – todos os dias e que
fazem parte do todo que somos, do nosso todo que podia ter sido outro, mas é
este.
Penso
no amor que um dia compartilhamos e hoje procuramos desesperadamente sem saber
se um dia será possível reencontrar.
Penso
na loucura, aquela que sou eu e não sei quem sou, aquele que é você,
acreditando que é de verdade. Porque a loucura é linda, pois ela é livre, ela
voa, ela sonha, ela constrói castelos em que podemos nos esconder da loucura
que não é loucura, é a insanidade da destruição.
Então
penso nas montanhas que já estão no passado, no vento cantando como um corte no
ar, penso quando vi pela primeira vez a nuvem entrando pela minha janela e eu
sentindo em minha pele sua suavidade. Nessa hora penso na saudade do que não
mais posso ter, ouvir ou ver. Na liberdade dos sonhos quando tentava descobrir
qual a língua do vento que só o topo da montanha entende.
Penso
na vida sem afeto, quando a gente acredita que é amor, apenas porque o outro
sabe dizer, mas não viver. Penso na emoção do momento criação que pode ser amor
ou vingança.
Então
penso na delicia da água na garganta da sede e percebo que sei coisas demais,
mas é o desconhecer que me habita.
Penso
nas variações da luz, a do sol e a da lua. Muita sombra ou pouca sombra: tênue,
difusa, pronta para os amantes.
Penso
na verdade, deturpada ou incompreendida toda vez que é dita.
Penso
no homem e no quase nada que finge viver, quando vive...
E
penso no tempo, que vagueia em lenta delicadeza e que o homem tenta alcançar,
mas lhe foge entre os dedos e o faz equivocar.
Penso
na nossa indolência diante da força dos sentimentos e de como não sabemos lidar
com eles.
Penso
no olhar, e no que dizem os olhos que não sabem ver.
Penso
no filho que tive e naquele que não nasceu.
Penso
que estou grávida de mim. Vou nascer mais uma vez, ou já nasci?
Apenas
algumas coisas entre as coisas que penso.
Madu Dumont
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