terça-feira, 15 de novembro de 2016

SENTIMENTOS



Os sentimentos estão longe de serem tangíveis e dizíveis quanto pretendemos crer. A maior parte dos sentimentos são inexprimíveis e ocorrem em um espaço onde nenhuma palavra alcança.
Nós sempre olhamos para fora, para o outro – que não nos pode ajudar. Existe apenas um caminho para “o sentir”, e é entrar em nós mesmos. Escavar dentro de nós uma resposta profunda, sem nos esquecer que é exatamente nas coisas mais profundas e importantes que estamos indizivelmente sós.
Nenhum homem pode responder às perguntas e aos sentimentos que têm vida própria em sua alma.
Não podemos buscar respostas que não podem nos ser dadas, porque não as saberemos viver.


GOSTAR


O gostar desperta o desejo que é uma experiência dos sentidos, análoga ao simples olhar ou ao gosto da fruta madura que adoça a boca. É uma grande experiência que nos é doada, um conhecimento do outro, o esplendor, o saber. O mal não está em aceitar este sentir, o mal está em abusar desta experiência.
A criação intelectual, se é que posso fazer essa comparação, a poesia, a prosa, provém também desse desejo carnal. Tem a mesma essência, é apenas uma repetição silenciosa, elevada e eterna do desejo do corpo.
O gostar evoca o futuro, mesmo que se estejamos enganados quanto e sobre o objeto do sentir, mesmo que estejamos cegos. O futuro virá, seja ele qual for.
Gostar é nos mostrarmos calmos e serenos, sem atormentar a nós e ao outro com nossas dúvidas. Nem nos assustarmos com alguma confiança ou meras alegrias, que jamais poderemos compreender.



PAIXÃO



Na paixão há as noites e os ventos que passam pelas cidades e percorrem um longo e desesperado caminho.
Na paixão nos sentamos à beira de um precipício e acabamos nos atirando, acreditando que basta um vento para nos salvar em um redemoinho de irracionalidade.
Na paixão alguém nos possui; e nos perde, sempre perde, e nós perdemos também.
Na paixão aquele que teve pode ser por “ele” perdido. Será o futuro; o fruto final de uma árvore onde somos a folha.
Como as abelhas reúnem o mel, tiramos o que há de mais doce no outro para construir a paixão e nos perdemos nela.
Começamos pelo menor, pelo apenas intuitivo, depois pelo desespero e pelo grito, e talvez por uma alegria compartilhada e superestimada em tudo que fazemos.
Na paixão mora a impaciência, o poder, o egoísmo.
Na paixão nos deixamos enganar pela solidão, apenas por existir algo dentro de nós que quer desesperadamente deixa-la.



AMOR

“O amor é fogo que arde sem se ver; é ferida que dói e não se sente; é um contentamento descontente; é dor que desatina sem doer.”
                                      Luis de Camões


Amar é bom: porque o amor é difícil. Amar talvez seja a tarefa mais árdua que nos foi imposta pela vida, a maior prova, o desfecho onde todo o resto foi apenas uma preparação.
Para amar é preciso aprender com nosso ser mais profundo, nossas forças concentradas, nosso coração temeroso, (se é que se ama com o coração).
O amor não é entregar-se, confundir-se à outra pessoa, o amor é tornar-se humano em nós mesmos, é nos transformar em nosso próprio mundo, mas que esse mundo seja maior e melhor, por causa do objeto do nosso amor.
O amor é atirarmos um ao outro, sem nunca esquecermos, de nos delimitar, de nos distinguir.
O mais difícil do amor é que não existe uma regra, uma solução ou um caminho.
O amor deve constituir-se em mútua proteção, limitação ou simplesmente no encontro de duas solidões humanas.
O amor só perdura quando fazemos a novidade viver em nós, nos acrescentamos, e que isso faça parte do mais íntimo de cada um.
O amor perdura quando corre no sangue a emoção de gostar, a loucura de apaixonar e a liberdade de sentir.
Reconheço que o amor nasce e sai de dentro de nós independente de onde ou a quem vai encontrar. Algo acontece em nós, a vida não nos esquece, nos segura pela mão e não nos deixa cair.
O amor se doa na medida certa, consegue dar um passo atrás para esperar o outro, quando ele não é tão rápido. No amor enxergamos além de nós mesmos, sem deixar de nos pertencer.
Só o amor ri das impossibilidades.
Talvez todo o medo que o amor inspira não passe de um desamparo que implora por auxílio.


Madu Dumont

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