NOSSO MUNDO INTERIOR
Acreditei um dia que havia desvendado você, sua intimidade.
Mas o tempo, que sempre foi implacável, a cada dia me
mostrava seu mundo interior, diferente daquele que eu acreditava ter descoberto
no dia anterior, diferente daquele que eu havia acabado de aprender.
Como me tornei patética diante do sonho, ou da pretensão de
desvendar sua intimidade. Hoje tão diferente daquela que se tornou agora...
Então tenho o desejo idiota e insensato de voltar no tempo,
de volta para aquele você, que deixei lá atrás e aproveitando; buscar também a
mim. Voltar naquele tempo em que intimidade tinha nome de inocência.
Descobri que a intimidade é tão efêmera e ardilosa como uma
miragem.
Mais ou menos como se surgissem contornos em uma neblina densa,
difusos, que aos poucos vão se tornando possíveis de reconhecer, como quando
nossos olhos se adaptam à escuridão e lentamente, vamos encontrando a direção.
Existem histórias que você, o mais íntimo, conta sobre mim. Como
existem histórias sobre mim, que conto a você, meu ser mais íntimo.
É difícil distinguir quais são as mais verdadeiras. Quais
delas podem refletir melhor nossas intimidades, quais estão mais próximas da
verdade? Apesar de eu acreditar que a verdade é apenas um desconhecer que nos
habita a alma, travestida de certezas, principalmente no quesito intimidade.
Todos nós temos segredos inconfessáveis, eu e você. Tão
inconfessáveis que fingimos esquecê-los. Ou será que os segredos nada têm a ver
com a intimidade? Ficam guardados em um lugar difícil de encontrar dentro de
nós, intocados e intocáveis.
Será que temos autoridade suficiente para falarmos das
intimidades, das suas, das minhas?
Mas em todas essas íntimas histórias, é possível existir mesmo
alguma diferença entre verdade e fantasia? Entre o certo e o errado? Entre o
agora e o ontem? Será que um dia já conseguimos desvendar o interior de
qualquer um de nós dois? E que por mais que venhamos a tentar, chegaremos até o
fim? Ou esta viagem será apenas mais uma viagem?
E na nossa mente, onde habita a intimidade, existem fatos? Ou
tudo será mais uma invenção, e os supostos fatos o fictício desejo do que
gostaríamos de viver?
Continuo sem saber quem somos. Quem sou eu, ou quem é você?
Agora não encontro mais a porta.
Madu Dumont
Madu Dumont
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